“Além do horizonte, existe um lugar”

EXCLUSIVO – Lançadas no dia 15 de abril, pela Superintendência de Seguros Privados (Susep), as circulares da autarquia 698/2024 e 699/2024 dispõem sobre as regras e critérios complementares de funcionamento e de operação da cobertura por sobrevivência oferecida em planos de previdência complementar aberta e em planos de seguro de pessoas, respectivamente. Ambas complementam dispositivos de duas resolução também recentemente aprovadas pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), a 463/2024 e a 464/2024, que fixaram o novo marco regulatório sobre a matéria.

“Ambas as circulares representam um esforço conjunto da Susep para consolidar e modernizar as normas anteriores, alinhando-se com novas leis e resoluções aprovadas pelo CNSP. Estas regulamentações são um passo significativo em direção a um mercado mais moderno e flexível, oferecendo opções mais claras e diversificadas para os participantes dos planos de previdência e seguro”, enfatiza o presidente do Clube Vida em Grupo do Rio de Janeiro (CVG-RJ), Edson Calheiros, à revista Apólice, que ouviu outros especialistas do mercado para abordar os principais aspectos das novas regras. Dentre elas, destacam-se: a inclusão da definição do conceito de “ciclo de renda”; a previsão da opção de o segurado contratar renda vitalícia nos planos indicados nas resoluções; a inclusão da faculdade do participante fazer aportes, no período inicial de adesão a plano com cláusula de Opt Out e o tratamento da nova pertinência temática trazida pelo Fundo ou Plano Exclusivo Familiar relativamente à resolução do VGBL.

Além de revogar seis circulares, cujos conteúdos foram ajustados e incorporados às duas novas circulares (698 e 699 de 2024), a publicação das duas circulares consolida os normativos da Susep que abordam a cobertura por sobrevivência oferecida em planos de previdência complementar aberta e em planos de seguro de pessoas, promovendo, ainda, ampla revisão dos normativos que tratam o assunto e garantindo uma adequação da regulamentação infralegal às Leis nº 14.652/2023, nº 14.754/2023 e nº 14.803/2023. 

“Essas circulares oferecem mais liberdade para os segurados e participantes dos planos. Por exemplo, eles agora podem optar por uma renda vitalícia, fazer contribuições adicionais no início do plano e criar planos exclusivamente familiares. Isso mostra uma adaptação dos produtos de seguro e previdência para atender às necessidades diversificadas dos consumidores. Ao reunir e cancelar normas anteriores, as circulares visam descomplicar o ambiente regulatório. Isso facilita para as seguradoras e para os participantes entenderem e seguirem as regras. Elas também procuram proteger os investimentos e incentivar a poupança para a aposentadoria, evitando estratégias que possam burlar a tributação. Isso promove maior segurança e estabilidade financeira para o futuro dos participantes”, pondera Calheiros.

O superintendente executivo da Bradesco Vida e Previdência, Rafael Barroso destaca alguns pontos das duas novas circulares da Susep que, segundo ele, poderão impactar positivamente na gestão das reservas financeiras das pessoas que contratarão um plano de previdência privada adaptado às novas possibilidades. “O primeiro diz respeito à forma de receber o benefício. Foi estabelecido na nova resolução o conceito de “ciclo de rendas”, pelo qual será possível o participante definir a programação do recebimento de rendas com diferentes períodos e modalidades. Ou seja, poderá optar, por exemplo, por acessar parte do saldo acumulado em renda mensal por um determinado período, e a outra parte, de maneira vitalícia. Essa flexibilidade refletirá em uma melhor adaptação na forma de cada pessoa usufruir a reserva financeira de acordo com suas necessidades e momento de vida”, avalia Barroso.

O outro ponto de impacto positivo, explica o executivo, refere-se à possibilidade de desvinculação entre o momento de contratação do plano e do momento da aquisição da renda. “Desta maneira, a forma de usufruir o recurso passa a ser uma decisão a ser tomada no futuro e, com isso, as seguradoras também terão a oportunidade de ofertar condições técnicas mais vantajosas e condizentes com o cenário econômico do momento de recebimento do montante acumulado, devido a uma maior previsibilidade financeira”, enfatiza Barroso.

Para o executivo da Bradesco, além disso, há a mudança ligada à adesão na previdência complementar que, antes desta circular, dependia da solicitação do colaborador para ser efetivada. “Agora, a partir dos novos planos que estão sendo constituídos, o sistema funcionará no esquema de Opt Out, ou seja, nele, a empresa pode incluir o empregado de forma automática no plano, cabendo a este último, caso queira, solicitar o seu cancelamento. Experiências internacionais mostram que essa simples atualização contribui para uma maior porcentagem de adesão. Quanto à resolução VGBL, que trata do Fundo ou Plano Exclusivo Familiar, a Bradesco Vida e Previdência ainda analisa as movimentações do mercado para que possa compreender qual será, de fato, o seu impacto”, antecipa Barroso.

Advogada especialista na área cível consultiva e contenciosa estratégica (judicial e administrativa), com ênfase, inclusive, em direito securitário, Glaucia Rispoli Rocha esclarece, inicialmente, que a cobertura por sobrevivência, oferecida em planos de previdência complementar aberta e em planos de seguro de pessoas, é uma característica fundamental para proporcionar segurança financeira ao segurado em vida. Essa cobertura, explica a especialista, tem como objetivo principal garantir benefícios ao segurado durante seu período de aposentadoria ou, em casos específicos, de sobrevivência em situações adversas, dependendo das condições estabelecidas no contrato do seguro ou plano de previdência.

“Tais inovações, em especial, a inclusão de definições claras no contrato, como o ‘ciclo de renda’, e a introdução de novas opções, como a possibilidade de contratar renda vitalícia, demonstram um esforço para atender às necessidades variadas dos segurados e garantir uma experiência mais satisfatória. Além disso, as mudanças relacionadas à faculdade de realizar aportes e ao tratamento do Fundo ou Plano Exclusivo Familiar refletem uma abordagem mais abrangente e inclusiva, que reconhece a diversidade de perfis e objetivos dos participantes dos planos de previdência complementar e seguros de pessoas. Portanto, no geral, essas circulares representam um passo importante na evolução do mercado de seguros, promovendo maior segurança e bem-estar financeiro para os segurados”, avalia Glaucia.

A advogada detalha a inclusão da definição do conceito de “ciclo de renda”: “Se refere ao período em que o segurado começa a receber os pagamentos periódicos decorrentes da cobertura por sobrevivência. Isso traz clareza sobre o momento em que os benefícios começam a ser pagos, proporcionando uma melhor compreensão aos segurados e garantindo transparência no processo.”

Para Glaucia, outra inovação promovida pelas circulares 698 e 694 de 2024 é a inclusão da opção de contratar renda vitalícia oferecendo aos segurados uma alternativa importante para garantir uma fonte de renda vitalícia após o término do “ciclo de renda”. “Isso proporciona segurança financeira em longo prazo e ajuda a proteger os segurados contra a possibilidade de esgotar seus recursos durante a aposentadoria”, observa a especialista, exaltando ainda a faculdade de o participante fazer aportes no período inicial de adesão ao plano com cláusula de Opt Out. “Essa faculdade permite que os participantes dos planos tenham maior flexibilidade e controle sobre suas contribuições, possibilitando a realização de aportes adicionais durante o período inicial de adesão. Isso pode ser especialmente vantajoso para aqueles que desejam aumentar sua reserva financeira e potencializar os benefícios futuros do plano”, assinala Glaucia, reforçando, ainda, a importância do Fundo ou Plano Exclusivo Familiar como oportunidade de planejar e proteger o futuro financeiro de seus entes queridos de maneira mais eficaz, alinhado com os objetivos familiares de longo prazo.

Embora as duas circulares 698 e 699, de 2024, representem um passo significativo na simplificação da regulação do seguro de pessoas no mercado brasileiro, a advogada Glaucia diz sempre haver espaço para aprimoramentos e é importante reconhecer que algumas lacunas regulatórias ainda podem ser identificadas: “Uma sugestão, nesse sentido, seria uma análise contínua das práticas e necessidades do mercado, com o objetivo de identificar possíveis áreas de melhoria na regulação. Isso poderia incluir aprimoramentos na proteção ao consumidor, como a padronização de cláusulas contratuais, e o estímulo à inovação na criação de produtos mais adequados às demandas dos segurados, como seguros adaptados a novos modelos de trabalho e estilo de vida. Além disso, a simplificação dos processos regulatórios e a redução de burocracias excessivas também poderiam ser consideradas para facilitar a introdução de novos produtos e a entrada de novos players no mercado, promovendo assim um maior benefício para os consumidores.”

Para Edson Calheiros, com a tecnologia avançando a passos largos, a regulamentação precisa acompanhá-la. Isso inclui, diz ele, cuidar da privacidade dos dados, usar ética nos algoritmos que definem preços e coberturas e garantir a segurança digital: “Caminhamos para a personalização, mas pode ser necessário ajustar ainda mais as regras para apoiar produtos que atendam perfeitamente a grupos específicos como idosos, jovens profissionais ou famílias com demandas complexas.”

Rafael Barroso, da Bradesco Vida e Previdência, antevê que as mudanças contribuirão para um aumento na contratação de planos de previdência privada com o decorrer do tempo e antecipa que a seguradora intensificará ainda mais sua estratégia de comunicação, especialmente por meio de seus corretores parceiros, para ressaltar todas as vantagens que tais reformulações regulatórias trarão aos seus clientes. “O consumidor, de um modo geral, passa a ter acesso a um maior poder de decisão e flexibilidade em seus planos de previdência privada. Outra vantagem é que a regulação, ao permitir maior flexibilidade, potencialmente reduz risco de precificação em diversos ciclos de renda, o que tende a levar a melhores condições para o consumidor final”, destaca Barroso.

Para a advogada Glaucia Rispoli, as duas novas circulares beneficiam o consumidor final de várias maneiras. Primeiro, ele terá uma compreensão mais clara dos termos do contrato e dos benefícios oferecidos, o que o ajudará a tomar decisões mais informadas. Além disso, a transparência aumentada proporciona maior confiança no mercado segurador, reduzindo o risco de conflitos e aumentando a satisfação do cliente. “A simplificação dos procedimentos também pode resultar em uma experiência mais rápida e conveniente para o consumidor ao adquirir e gerenciar seu seguro. Isso significa menos burocracia e menos barreiras para acessar a proteção financeira necessária”, conclui.

Edson Calheiros, do CVG-RJ, entende ser crucial continuar aprimorando a clareza das condições dos seguros e investir na educação financeira para que as pessoas façam escolhas bem-informadas sobre produtos e consigam entender as regras e os manuais. “Como sugestões para aprimoramento regulatório penso em diretrizes claras para a integração de novas tecnologias, focando em proteger e respeitar os dados dos consumidores. Manter conversas frequentes entre reguladores, seguradoras, consumidores e especialistas em tecnologia para se antecipar às tendências e ajustar a regulamentação de forma proativa. Considero de suma importância criar um sistema para revisar e atualizar as normas regularmente, garantindo que continuem relevantes e eficazes para atenderem as demandas futuras”, sugere Calheiros, para quem é fundamental que o setor invista em programas que aumentem a compreensão financeira e regulatória dos consumidores, ajudando-os a entender melhor os produtos e tomar decisões mais conscientes.

André Felipe de Lima
Revista Apólice

* Esta matéria foi originalmente publicada na Edição 297

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